segunda-feira, novembro 09, 2009

Yoani não pode ser calada

Muitos devem estar se perguntando: mas você não era defensora de Cuba e do comunismo castrista? Eu era! Mas não sou mais.
Simplesmente, porque antes era contra o discurso norte-americano contra Cuba. Justamente porque não acreditava em uma benevolência para acabar com um regime ditatorial, já que os Estados Unidos foram os responsáveis por ditaduras em vários países da América Latina, inclusive o meu. Isso não é teoria da conspiração. Foram abertos vários documentos da CIA, em que se comprova a forte ligação norte-americana com os militares latino-americanos.
Enfim, mas hoje o mundo mudou. E no mundo de hoje sou mais Obama que Fidel. Simplesmente porque as políticas mudam e também algumas que não mudam (como a cubana), não se encaixam mais neste século.
E também, porque defendo a autonomia dos povos. Somente quem vive em um país deve lutar para que ele possa mudar e não uma intervenção externa, de um país que tenha interesses econômicos e ideológicos. As interferências externas devem haver em casos de guerra civil, em que o povo não consiga resolver por si só.
Dito isso, sou pró-Ioani, a blogueira que desafia o forte aparato repressor cubano para realmente nos dizer o que acontece em Cuba. Seu blog Generación Y é livre para falar realmente o que acontece. E a moça, que é pouco mais velha que eu, tem uma coragem que me orgulha.
Por isso, nós blogueiros, temos que defendê-la. Não podemos deixar de falar do que tem acontecido com ela. Se o mundo continua denunciando as agressões que ela e outros cidadãos sofrem, podemos, talvez, "blindá-la" de uma morte prematura. Sim, eu tenho medo que o pior lhe aconteça. ´
Por isso, abaixo eu reproduzo o post que ela escreveu no Generación Y, no dia 7 de novembro, após apanhar de agentes repressores:

"Próximo da rua 23 e exatamente no trevo da Avenida de los Presidentes foi que vimos chegar num automóvel preto - de fabricação chinesa - tres robustos desconhecidos: “Yoani, entre no automóvel” me disse um enquanto me continha fortemente pela mão. Os outros dois rodeavam Claudia Cadelo, Orlando Luís Lazo e uma amiga que nos acompanhava para uma marcha contra a violência. Ironias da vida, foi uma tarde cheia de golpes, gritos e palavrões que deveria transcorrer como uma jornada de paz e concórdia. Os mesmos “agressores” chamaram uma patrulha que levou minhas outras duas acompanhantes, Orlando e eu estávamos condenados ao automóvel de chapa amarela, ao pavoroso terreno da ilegalidade e à impunidade do Armagedón.

Neguei-me a subir no brilhante Geely e exigimos que nos mostrassem uma identificação ou uma ordem judicial para levar-nos. Claro que não mostraram nenhum papel que provasse a legitimidade de nossa prisão. Os curiosos se comprimiam ao redor e eu gritava “Ajuda, estes homens querem nos sequestrar”, porém eles pararam os que queriam intervir com um grito que revelava todo o fundo ideológico da operação: “Não se metam, estes são uns contrarrevolucionários”. Ante nossa resistência verbal, pegaram o telefone e disseram à alguém que devia ser o chefe: O que fazemos? Não querem entrar no automóvel”. Imagino que do outro lado a resposta foi taxativa, porque depois veio uma explosão de golpes, empurrões, me levaram de cabeça para baixo e tentaram enfiar-me no carro. Resisti na porta…golpes nas juntas…consegui pegar um papel que um deles levava no bolso e o meti na boca. Outra explosão de golpes para que devolvesse o documento.

Orlando estava dentro, imobilizado numa chave de karatê que o mantinha com a cabeça colada no chão. Um pôs seu joelho sobre meu peito e o outro, do assento da frente me batia na região dos rins e me golpeava a cabeça para que eu abrisse a boca e soltasse o papel. Num momento, sentí que nunca sairia daquele automóvel. “Chegaste até aqui Yoani”, “Acabaram tuas palhaçadas” disse o que ia sentado ao lado do chofer e que me puxava o cabelo. No assento de trás um espetáculo invulgar acontecia: minhas pernas para cima, meu rosto avermelhado pela pressão e o corpo dolorido, do outro lado estava Orlando restringido por um profissional da surra. Só consegui agarrrar este - através das calças - nos testículos, num ato de desespero. Afundei minhas unhas, supondo que ele iria continuar esmagando meu peito até o último suspiro. “Mate-me já” gritei, com o último fôlego que me restava e o que ia na parte da frente advertiu ao mais jovem “Deixe-a respirar”.

Escutava Orlando ofegar e os golpes continuavam caindo sobre nós, pensei em abrir a porta e atirar-me, porém não havia uma maçaneta por dentro. estávamos a mercê deles e escutar a voz de Orlando me dava ânimo. depois ele me disse que o mesmo ocorria com as minhas palavras entrecortadas…elas lhe diziam “Yoani continua viva”. Nos descartaram doloridos numa rua de la Timba, uma mulher acercou-se “O que lhes aconteceu?”… “Um sequestro”, atinei de dizer. Choramos abraçados no meio da calçada, pensava em Teo, por Deus como vou explicar-lhe todos esses hematomas. Como vou dizer-lhe que vive num país onde isto acontece, como vou olhá-lo e contar-lhe que a sua mãe, por escrever um blog e por suas opiniões em kilobytes, foi agredida em plena rua. Como descrever-lhe a cara despótica dos que nos colocaram a força naquele automóvel, o prazer que se notava ao pegar-nos, ao levantar minha saia e arrastar-me semi-nua até o carro.

Consegui ver, não obstante, o grau de temor de nossos atacantes, o medo ao novo, ao que não podem destruir porque não compreendem, o terror valentão dos que sabem que tem seus dias contados.

Traduzido por Humberto Sisley de Souza Neto"

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